Artigo: O desafio da diplomacia da paz em tempos de guerra

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Por: Luís Bassoli*

As relações internacionais são feitas com diálogo e ações sutis, com todo cuidado para não estremecer os vínculos bilaterais nem causar constrangimentos.

O Ministério das Relações Exteriores tem o nome de Itamaraty e o ministro é chamado de Chanceler.

A diplomacia brasileira é reconhecidamente de excelência; o Itamaraty foi criado há 200 anos (em 1823), mas suas bases se iniciaram ainda no período colonial, com o brasileiro Alexandre de Gusmão, considerado o “avô dos diplomatas”.

Nossa diplomacia atua como questão de Estado, não se submete a ideologias/vontades de governantes – democracia ou ditadura, direita ou esquerda.

Foi assim com o Visconde de Uruguai (governo D. Pedro II); Barão do Rio Branco (início da República); Osvaldo Aranha (ditadura de Getúlio Vargas).

Até nos piores momentos da ditadura de Garrastazu Médici, o Itamaraty resistiu (o quanto pode) para manter seu papel; nessa época, com o Chanceler Mário Barbosa, o Brasil mudou a postura incondicional pró-Israel, em relação aos conflitos regionais, por uma aproximação com a Liga Árabe, fundamental para enfrentar a primeira crise do petróleo.

O único “desastre absoluto” se deu na gestão de Ernesto Araújo, no governo Bolsonaro, um inapto fundamentalista, cuja própria estrutura do Itamaraty conseguiu amenizar.

Na atual guerra Israel-Hamas, o Itamaraty mostrou sua eficiência: fomos o primeiro país a resgatar nossos cidadãos de Israel.

Mais de mil foram repatriados, sem custo para nenhum deles, em aviões da FAB.

Isso foi possível graças a sofisticadas ações feitas “fora dos holofotes”, com discrição e assertividade, que envolveu negociações com Itália (onde os aviões fizeram escala), Egito, Israel e Autoridade Palestina.

Uma “sacada” do governo foi tirar o Chanceler Mauro Vieira do centro das negociações, visando a discrição, escalando o chefe da assessoria internacional da Presidência, o ex-Chanceler Celso Amorim, para fazer os contatos.

O desafio, agora, é resgatar os cerca de 30 brasileiros que estão na Faixa de Gaza.

Com a intermediação do embaixador na Palestina, Alessandro Candeas, o grupo foi retirado das áreas mais atacadas pelo exército israelense e levado às cidades de Khan Yunis e Rafah, na fronteira com o Egito, abrigado em imóveis alugados pelo governo brasileiro.

O avião presidencial está no Cairo, capital do Egito, de prontidão para trazer os brasileiros para casa.

O problema é que Israel impossibilita a saída de quem quer que seja de Gaza.

Na semana passada, o Itamaraty convocou o embaixador de Israel, Daniel Zonshine, para esclarecer as críticas que fez ao governo por não considerar o Hamas um grupo terrorista.

A convocação de um embaixador é uma espécie de “puxão de orelha”; se não der resultado, ações mais duras podem ser tomadas, como retirar o embaixador brasileiro de Israel, expulsar o embaixador israelense do Brasil, fechar ambas as embaixadas e, por fim, a mais drástica, romper as relações binacionais.

Após a convocação, o israelense adotou um “tom ameno” e o governo brasileiro, apesar de não reclassificar o Hamas para “grupo terrorista”, reafirmou que suas ações foram “ataques terroristas”.

Caso o governo não consiga resgatar os brasileiros da Faixa de Gaza, ou pior, que eles sejam mortos por Israel, as relações bilaterais poderão sofrer um abalo sem precedente.

* Luís Bassoli é advogado e ex-presidente da Câmara Municipal de Taquaritinga (SP).

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

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